No início de maio foram divulgados os novos preços mínimos para o trigo pelo governo, elevando as referências e chamando a atenção do mercado, “destoando do que era esperado”, como explica o analista da Safras & Mercado, Élcio Bento. A nova referência é de R$ 1463,00 por tonelada, contra R$ 1320,00 do ano passado, mesmo com os custos de produção da temporada anteriror estando muito mais altos do que os atuais. “E sinceramente, ainda não sabemos muito bem como será operacionalizada esta necessidade do governo intervir”, complementa o especialista.
A nova safra brasileira de trigo, afinal, é esperada em 12 milhões de toneladas, o plantio começa bem, dando condições para que este número seja alcançado, da mesma forma como desenha um cenário em que os preços estariam, naturalmente, em patamares mais baixos, entre R$ 1100,00 e R$ 1200,00.
“Se o governo tiver uma diferença de preços de mercado e de preço mínimo em torno de R$ 400,00 por tonelada, mesmo para colocar PEP e Pepro seria muito caro. Se for para adquirir trigo, com o governo pagando R$ 1463,00 em relação a algo R$ 1100,00 e R$ 1200,00 do mercado, vai ser um ano bastante baagunçado e de necessidade de intervenção governamental. Como será feita essa intervenção vai ditar muito de como será esse mercado”, explica o analista.
Bento lembra ainda que o governo não tinha necessidade de intervir no mercado desde a safra 2016/17, “e eu, particularmente, acho que é muito mais interessante para o produtor quando as condições de mercado internacional estão favorecendo os preços. Com a intervenção governamental, fica mais bagunçado o mercado”.
Neste ambiente onde “dois mercados” podem se desenhar para a formação dos preços do trigo brasileiro, a orientação do analista é de que o produtor conte com estratégias de comercialização bastante detalhadas para capturar as melhores oportunidades que tendem a se apresentar nesta temporada.
Veja a entrevista completa de Élcio Bento ao Notícias Agríclas nesta terça-feira:
CENÁRIO BRASILEIRO X CENÁRIO GLOBAL
O cenário atual e a próxima temporada – 2023/24 – para o quadro global de oferta e demanda do trigo ainda indicam um aperto considerável e, portanto, preços sustentados. Os números trazidos pelo USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) apontam para este quadro, como explicou o analista da Safras & Mercado. No Brasil, porém, as cotações podem não sentir da mesma forma já que se espera uma boa safra.
Nos últimos dois anos, o país exportou cerca de três milhões de toneladas do grão – dado o desorganizado contexto geopolítico que deu ao trigo brasileiro mais protagonismo no quadro internacional – mesmo sendo algo que, até pouco tempo atrás, parecia bastante distante.
“Tivemos uma abertura do mercado brasileiro, o trigo brasileiro foi colocado na vitrine do mercado internacional. Então, os compradores sabem que, em algum momento, vai ter excedente para ser comprado do Brasil. Mas, a situação a que temos que estar bastante atentos é que, nem sempre, será pelos preços que tivemos nos últimos anos”, detalha Bento.
Neste momento, o trigo nacional está caro frente aos seus concorrentes internacionais. Em relação ao trigo russo, o brasileiro teria que estar sendo negociado entre R$ 1100,00 e R$ 1200,00, enquanto os atuais valores variam de R$ 1250,00 a R$ 1300,00.
Além do mercado nacional, o analista destaca ainda a abertura do mercado nordestino para o trigo gaúcho, o que ajuda no escoamento mais efetivo da safra recorde colhida na última temporada e, consequentemente, na formação de preços um pouco melhores.
“Então, a demanda existe. Nem sempre aos preços que o produtor precisa para cobrir seus custos de produção, mas já é uma novidade a mais, com essa abertura dessa válvula de escape que leva produto para o mercado internacional ou para o mercado nordestino”, afirma. Afinal, para formar os preços para o produto brasileiro, além do movimento das cotações innternacionais, há ainda o abastecimento interno e a paridade de importação quando há escassez, bem como a movimentação do câmbio.