Vende agora? Ou aguarda o segundo semestre para avançar com os negócios? Estas são as duas perguntas mais frequentes que o mercado brasileiro de soja têm promovido neste momento e apenas uma resposta é comum agora: há um mercado diferente para cada sojicultor deste país atualmente. São realidades distintas, regiões diferentes, custos variáveis e, principalmente, necessidades muito particulares. Por isso, dos cinco analistas e consultores de mercado que o Notícias Agrícolas ouviu, apenas nesta reportagem para trazer algumas destas respostas, todos afirmaram que não há uma análise ou uma afirmação comum que possa atender a todos os produtores.
O Brasil tem pouco menos de 50% da safra 2022/23 comercializada até agora, ainda segundo os especialistas, e deverá carregar um volume considerável da oleaginosa para ser vendido no segundo semestre. O período pode, de fato, trazer alguma oportunidade ao produtor brasileiro, porém, as ofertas brasileira e norte-americana podem se chocar em algum momento, disputar mercado e preço, naturalmente.
Além disso, ainda é preciso contabilizar que o potencial produtivo da soja cresceu de forma tão expressiva e intensa que a capacidade logística nacional tem estado estrangulada, refletindo diretamente em prêmios muito pressionados, marcando seus piores níveis em mais de 20 anos, segundo explicam analistas e consultores. E frente a isso, embora a resposta para as primeiras perguntas não seja comum, a pressão agressiva e inevitável sobre o prêmio – e de que este seria o vilão da formação dos preços neste ano comercial – esteve, até agora, presente em todas as análises.
Veja o que disseram os analistas e consultores de mercado ouvidos pelo Notícias Agrícolas.
Cristiano Palavro, diretor da Pátria Agronegócios
Para o diretor da Pátria Agronegócios, Cristiano Palavro, o mercado da soja pode se recuperar, mas seguirá ainda pressionado nesta reta final de abril e início de maio. Assim, o atual momento é diferente para cada produtor, porém, até maio a pressão sobre os preços no mercado nacional deve continuar. A partir do próximo mês, os preços podem passar por um momento de “estabilização”, também motivado por um aperto maior entre os derivados e uma demanda pelo grãos brasileiro, que está muito competitivo no mercado internacional.
“Até maio há pouca solução, pouca coisa no radar. Será difícil uma recuperação dos preços no curto prazo”, diz.
Assim, o produtor que tem condições para segurar suas vendas e realizá-las após esse período, poderia ter oportunidades. No entanto, Palavro lembra que carregar essa soja tem custos financeiros, de armazenagem, quebra técnica e, para alguns deles, portanto, esse cálculo precisa ser levado em consideração.
Afinal, embora os prêmios devam estar melhores no segundo semestre, com o fluxo melhorando e os portos estando menos congestionados, irão se deparar com os futuros da oleaginosa negociados na Bolsa de Chicago operando em patamares mais baixos, como já mostra a curva das cotações neste momento. “Os contratos de agosto, setembro já estão mais baixos agora, os prêmios não”, orienta.
Vlamir Brandalizze, consultor de mercado da Brandalizze Consulting
“Agora, cada um é cada um. Quando vence as dívidas do produtor?”, questiona o consultor de mercado Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting. E complementou dizendo que os profissionais que têm dívidas para agosto, por exemplo, poderiam segurar suas vendas por mais algo entre 40 e 45 dias para garantirem melhores momentos, principalmente dos prêmios. “Neste período eles já devem ter perdido uma parte dessa força negativa”.
Os atuais patamares de preços – tanto nos portos, quanto no interior do Brasil – não oferecem prejuízo ao produtor brasileiro, embora resultem em margens bem mais baixas do que em anos anteriores. Além disso, o mercado brasileiro sente agora uma pressão maior de venda por parte dos sojicultores, que têm refeito suas estratégias para garantir as rápidas oportunidades que aparecem.
“A soja continua mostrando forte pressão de venda, com corrida de venda pelos produtores buscando caixa para quitar dívidas que vencem neste mês. Desta forma, mesmo com os preços em queda, os produtores continuam vendendo forte nestes últimos dias”, epxlica Brandalizze. “Em pouco mais de uma semana, as vendas já estão perto das cinco milhões de toneladas de fechamentos de balcão, o que serve para pressionar ainda mais o mercado para baixo”.
Ainda segundo o consultor, as programações de embarques desta soja estão sendo empurradas para agosto e setembro. “Assim, com alto custo do dinheiro, juros altos – que chegam aos 25% ao ano – estão sendo repassados aos produtores, e assim, o mercado todo de balcão no Brasil já desceu para menos de R$ 130,00 aos produtores, até mesmo no Rio Grande do Sul, que registra uma quebra de safra. Fôlego para reverter no curto prazo não há”, afirma Brandalizze.
Ginaldo Sousa, diretor geral do Grupo Labhoro
O cenário não é muito bom e também não muito claro para este momento, segundo avalia o diretor geral do Grupo Labhoro, Ginaldo Sousa. “Temos uma super safra e a demanda, apesar de alguns bons sinais da China, ainda é fraca”, diz. E Sousa complementa dizendo ainda que muitos produtores carregaram muita soja, e o que se pode contar agora é com o prêmio e uma recuperação dos mesmos sobre com a qual se conta mais a frente, em especial a partir do começo do segundo semestre.
O diretor da Labhoro alerta também para os custos que carregar essa soja têm gerado ao sojicultor brasileiro, incluindo a armazenagem e o que se perde com a quebra técnica, além do custo financeiro das operações, o que deixa ainda mais evidente a necessidade que cada produtor tem de revisitar suas estratégias e personalizá-las de acordo com a gestão de seu negócio, aos seus compromissos financeiros e a quanto já comercializou de sua safra.
A concentração da oferta se deu com a colheita brasileira acontecendo quase toda de uma só vez, depois se chocou com uma insuficiente e prejudicada infraestrutura logística, além de chuvas excessivas nas regiões dos portos, o que deixou-os ainda mais congestionados. “E agora temos ainda meia safra para comercializar”, diz, reforçando que isso acontece em meio a questionamentos do produtor brasileiro sobre o futuro da Bolsa de Chicago, dos prêmios, do dólar, do comportamento da demanda.
Agora, o importante será monitorar a nova safra dos Estados Unidos. “Chicago pode cair muito mais, tudo depende da safra americana. E por enquanto não temos ameaças do clima para as regiões produtoras”, explica o executivo. E lembra que que os vencimentos mais distantes já têm diferença de cerca de US$ 2,00 por bushel em relação aos mais próximos, começando a precificar uma safra cheia nos EUA.
Assim, Sousa também espera que as próximas semanas sejam melhores para o escoamento da soja, com os portos ficando menos congestionando, dando espaço para que os prêmios sigam se estabilizando. “O produtor vendeu muito pouco e tem muita soja para vender. Quem optar por vender no segundo semestre não pode esquecer que vai vender com menos US$ 2 na tela em Chicago e será preciso que os prêmios estejam muito positivos para não perder dinheiro. É uma conta que precisa de muita atenção”, conclui.
Luiz Fernando Gutierrez, analista da Safras & Mercado
Embora as decisões de venda vão depender das necessidades de cada produtor, o analista da Safras & Mercado, Luiz Fernando Gutierrez, acredita que há uma parcela grande dos produtores que precisam avançar agora ou nas próximas semanas com seus negócios pela dificuldade de armazenagem. “Muitos irão se ver diante disso, até porque nossa comercialização está atrasada. Então, esse ritmo vai ter que aumentar, com uma boa parte dos produtores tendo que acessar o mercado mesmo com os preços pressionados”, diz. E assim com os demais especialistas, acredita que, mais a frente, os prêmios devem estar mais firmes, porém, com um Chicago mais fragilizado.
Assim, para equilibrar estas contas, o produtor terá ainda que monitorar a relação cambial e, ao mesmo tempo, o cenário climático no Meio-Oeste americano, “medindo os riscos que ele tem este ano”, que são maiores e mais intensos. E também pontua os custos financeiros de segurar a soja nesta temporada. “O produtor tem que usar a taxa livre de risco do mercado, que é a Selic, e ele tem que entender que se ele está segurando o produto, está abrindo mão de ganhar o que a Selic nos traz por mês. E essa conta ele tam que fazer também”, explica.
A oferta brasileira de soja deverá ser, efetivamente, menor no segundo semestre, com boas perspectivas de exportações e esmagamento neste ano. Ainda assim, devemos ter maiores estoques de passagem e menos espaço para recuperações muito fortes dos preços. O que faz com que o acompanhamento do clima no Corn Belt se torne ainda mais importante, já que será um dos principais vetores para a direção das cotações em Chicago.
Gutierrez acredita ainda que o mercado brasileiro não deve ter preços regionalizados nesta temporada diante da boa safra colhida. “De uma forma geral – com exceção do Rio Grande do Sul que deve ter prêmios talvez menos pressionados – durante todo os estados devem trabalhar todos em linha, sem grandes diferenças, com preços regionalizados. Devemos ter esse alinhamento, salvo alguma surpresa que possa acontecer, porque não temos problemas produtivos que possam provocar alguma distorção lá na frente”.
Aaron Edwards, consultor de mercado da Roach Ag Marketing
“Eu sou contra vendas neste período da safra, se for possível evitar. Agora, esperar para o próximo semestre, a resposta é sim. Mas esperar ‘cegamente’ é um pouco complicado. Sazonalmente, vendas de setembro a novembro podem se dar em um bom período, geralmente, então é uma safra interessante”, avalia o consultor de mercado Aaron Edwards, da Roach Ag Marketing. Os sinais de alerta, no entanto, chegam sobre a nova safra dos Estados Unidos e o plantio que, por lá, começou acelerado para a safra 2023/24. Assim, complementa dizendo que “vendas um pouco mais cedo, no meio do ano, podem fazer parte da estratégia”.
O momento deste “mercado invertido” – com a diferença entre os contratos na CBOT versus os prêmios nos meses mais curtos contra os mais longos – as contas dos custos financeiros e de armazenagem são ainda mais pertinentes e precisam ser refeitos sempre para que o produtor possa capturar as oportunidades que forem surgindo. Esse é uma grande desafio de um mercado como este, alerta Edwards.
“Se for um ano típico, o que vamos ver, possivelmente, é uma recuperação no curto prazo com incertezas na safra norte-americana e depois uma queda mais prolongada, falando historicamente”, diz.
Com isso, assim como os demais especialistas, o consultor afirma que “cada produtor entenda a sua situação” frente aos fatores que compõem o preço, incluindo Bolsa de Chicago, prêmio e dólar, mas também o comportamento da demanda, incluindo o cenário em sua região – seja para exportação oiu atendimento do mercado interno.