Os preços da soja recuaram em todas as regiões de comercialização do Brasil nesta semana. A bomba das retenciones zeradas até o dia 31 de outubro na Argentina – anunciada pelo governo Javier Milei na última segunda-feira (22) – trouxeram uma pressão adicional aos futuros da oleaginosa negociados na Bolsa de Chicago -, os prêmios cederam no país e o dólar caiu forte frente ao real nos últimos dias. Nesta terça (23), a moeda americana terminou o dia com mais de 1% de queda e fechou abaixo dos R$ 5,30, já buscando retomada nesta quarta, operando perto de R$ 5,32 nesta quarta-feira (24).
“A Argentina ficou mais barata, abriu espaço, e a China correu pra garantir volumes. Isso pesa nos spreads e empurra os prêmios BR pra baixo, principalmente novembro, justamente o mês mais sensível”, afirmam os analistas da Royal Rural.
Na tarde desta quarta-feira, a consultoria informou uma baixa de cerca de 30 cents no prêmio para outubro/25, que está em 130 centavos de dólar acima das cotações de Chicago, 20 cents de baixa no novembro – para 140- e 10 cents no fevereiro/26 para 50 pontos sobre a CBOT.
As baixas da soja no físico brasileiro variaram entre as regiões. Os relatos são os mais diversos. Além do recuo nas três variáveis que formam o tripé formador de preços da soja no mercado brasileiro, a demanda pela soja argentina se intensificou nesta semana, já supera dois milhões de toneladas em apenas dois dias sem impostos, e ajuda a pesar sobre as cotações no Brasil.
Da última sexta até ontem, as cotações no interior do país perderam até 4,6% em algumas áreas, como foi o caso de Castro/PR, onde a saca saiu de R$ 132,00 para R$ 126,00; ou 4,06% em Rondonópolis/MT, caindo 4,06% de R$ 130,40 para R$ 125,10. Em Não-Me-Toque/RS, a baixa foi de 1,7% – de R$ 121,00 para R$ 119,00 por saca -, e em Jataí, com a mesma perda, passou de R$ 119,00 para R$ 117,00/sc.
“O mercado interno brasileiro sangrou com muita força nesta semana. Tivemos queda do dólar, dos prêmios e de Chicago. A queda em Chicago se iniciou com a tentativa de tratativa comercial entre EUA e China que falharam, depois no começo desta semana a suspensão temporária das retenciones na Argentina. E nesta reta final de ano, em que o mercado americano teria este ganho da demanda, sem mais excedente produtivo na América do Sul, seria normal haver uma concentração das compras no mercado americano, mas com essa medida sobre as retenciones, o cenário é outro”, explica Matheus Pereira, diretor da Pátria Agronegócios.
Somente nesta semana, a China já teria comprado mais de 20 navios de soja argentina, aproveitando os bons preços e o ávido interesse vendedor dos produtores por lá neste momento. “Isso derrubou nossos prêmios, principalmente o prêmio spot, uma vez que perdemos parte da nossa competitividade, derrubou Chicago, e fora a pressão do dólar, que já vinha em baixa nos últimos dias justificado pela arbitragem de juros no passado e pressionado ainda agora pelas ‘trocas de carícias’ entre Trump e Lula”, complementa Pereira.
O direto da Pátria acredita que este deva ser um movimento temporário, todavia, afinal os fatores que agora exercem esta pressão mais severa e acentuada sobre os preços também são variáveis temporárias.
“Há quedas em todas as regiões, o que muda é o tamanho da perda”, explica o consultor de mercado Vlamir Brandalizze, consultor de mercado da Brandalizze Consulting, que afirma que onde caiu menos a saca perdeu R$ 2,00 e onde caiu mais, R$ 5,00. “Aparentemente, como deu uma esfriada nos prêmios, eu acredito que esteja havendo uma demanda menor, efetivamente, nos portos, porque nos portos também os preços recuaram. Há uma pressão menor de demanda nos portos, uma pressão menor no interno, a indústria levando da mão para a boca apenas o que precisa”.
Brandalizze explica que este momento de “reta final do ano” já é tradicionalmente de acomodação dos preços, dos mercados, e a condição da Argentina deixou isto mais agressivo e mais evidente. Mais do que isso, o mercado também sente a oferta de 46 a 47 milhões de toneladas ainda a serem negociadas. “É muita soja e, agora com o avanço da colheita americana e a Argentina vendendo, acaba tirando uma parte da demanda por aqui. Fôlego de reação só se a China entrasse de volta ao mercado americano para puxar Chicago, porque dólar segue sem rumo e os prêmios, aparentemente, gastaram o que tinham de positivo, sem sinais de reação no curto prazo”.
Neste quadro, apesar da pressão mais agressiva sendo pontual, para o produtor que ainda não vendeu o momento é mais difícil e as oportunidades para retomar as vendas podem se mostrar mais escassas daqui em diante. “O cavalinho encilhado passou. Quem não vendeu vai ter que esperar uma reação que, se vier, virá quando China se alinhar com os EUA e Chicago reagir”, complementa o consultor, que disse ainda acreditar ainda em um acordo entre as duas maiores economias do mundo. “A China não vive sem os EUA e o EUA não vivem sem a China. E a soja é um produto estratégica dos dois lados”, afirma Brandalizze.